Você sabia que a Mata Atlântica é o bioma mais devastado do Brasil em percentual? Atualmente, só 7% de sua cobertura original é remanescente. Mesmo assim, ela possui uma incrível biodiversidade: hoje, a Mata Atlântica abriga 261 espécies de mamíferos, 620 de aves, 200 de répteis e 280 de anfíbios, sendo que 567 espécies só ocorrem nesse bioma. Sua flora é representada por cerca de 20 mil espécies de plantas vasculares, das quais oito mil são endêmicas, ou seja, só ocorrem ali. Desse modo, este bioma está no grupo dos 25 biomas de maior biodiversidade do planeta.
Uma possível forma de restauração da Mata Atlântica e a consequente solução para o cenário de extinção que as espécies que a habitam se encontram, é a agrofloresta. Conversamos com nosso voluntário Luiz Fernando Zin Battisti, que é Engenheiro Agrônomo e doutorando em Agroecossistemas na Universidade Federal de Santa Catarina para entender mais sobre o tema deste artigo.
O desmatamento da Mata Atlântica e suas consequências
A Mata Atlântica vem sendo explorada desde a época da colonização, ou seja, nos últimos 500 anos, em que grande parte da população originária foi dizimada e muito conhecimento do uso das espécies nativas foi perdido.
Hoje em dia, na Mata Atlântica, estão as maiores cidades brasileiras, e é onde mora a maior parte dos habitantes do país. Porém, a população urbana tem pouca intimidade com a natureza e com as espécies nativas, e a população rural interage cada vez menos com essas espécies, produzindo basicamente espécies exóticas. Junto à isso, temos o avanço do desmatamento, levando a uma situação de extinção de espécies, principalmente as mais sensíveis.
“Uma das formas de preservar a Mata Atlântica é utilizando suas espécies”, ressalta Luiz. “É um dos biomas mais biodiversos do mundo e as pessoas que moram nele quase não interagem com sua biodiversidade”.
E, como a Mata Atlântica é um bioma florestal, sistemas agroflorestais se apresentam como um modelo de agricultura ideal para o cultivo, já que pode encaixar muitas espécies em um sistema produtivo.
Açaí-juçara: o açaí da Mata Atlântica
Como exemplo de preservação de espécies através do uso, Luiz cita o açaí-juçara, o açaí da Mata Atlântica: “Nós acabamos trazendo o açaí da Amazônia, que atravessa o Brasil inteiro para chegar aqui para comermos açaí, sendo que temos o nosso açaí aqui. É uma espécie que estava ameaçada de extinção, pois foi dizimada nos últimos séculos para a extração do seu palmito, mas o uso dos frutos para fazer o açaí da juçara está mudando este cenário”.
Luiz possui uma empresa de produção de açaí-juçara em sistema agroflorestal, chamada Açaí-Juçara da Montanha. Junto com seu sócio, Arthur, ele aproveita esse potencial das palmeiras juçara para produzir açaí, abastecendo o mercado local e reduzindo a dependência do açaí amazônico.
Imagem: poracaso.ocp.news
A mini agroindústria fica em meio à Mata Atlântica e os dois sócios são responsáveis por todo o processo. Eles fazem as coletas e também contam com alguns parceiros que comercializam o fruto. Além disso, também compram os frutos açaí-juçara de pessoas que possuem a palmeira em suas propriedades.
Dessa forma, junto com outras empresas que também trabalham com o açaí-juçara, eles vêm construindo essa cadeia produtiva do nosso açaí, que ainda é muito incipiente, mas tem um potencial enorme.
Imagem: poracaso.ocp.news
O que é agrofloresta e qual sua importância?
Agrofloresta é uma ferramenta aplicada para conservar o meio ambiente, enriquecer a qualidade do solo, sequestrar carbono da atmosfera, melhorar a qualidade da água e do ar, além de produzir alimento, madeira e plantas medicinais.
Ser uma agricultura que se integra, ao invés de se contrapor à floresta e ao meio ambiente, é o princípio da agrofloresta. Todos os seres vivos em cooperação, gerando mais e mais vida. É a agricultura sintrópica, que busca acumular energia através de biomassa vegetal. Essa biomassa é cortada e reinserida no sistema sobre o solo, sucessivamente, de modo que o sistema torna-se cada vez mais abundante e produtivo à longo prazo.
De acordo com Luiz, a agrofloresta é um sistema composto por diferentes espécies, de diferentes extratos (alturas), que ocupam o espaço de uma forma muito inteligente, sendo muito mais produtivo quando comparado ao cultivo em monocultura.
“Juntas, essas espécies de diferentes hábitos e extratos geram um ganho muito grande para a natureza, porque acabam interagindo entre si e todo o meio ambiente ganha. Por exemplo, o café cresce bem na sombra, e o abacateiro cresce bem no sol, então podemos plantar essas duas espécies uma ao lado da outra. Assim, o café se desenvolve na sombra do abacateiro e, dessa forma, potencializamos a produção do alimento por metro quadrado”, completa Luiz.
Luiz acrescenta também que existem experiências de locais onde não chovia há anos e, depois da implantação de sistemas agroflorestais, voltou a chover. Portanto, a tecnologia mudou o regime hídrico desses locais de forma positiva.
“A agricultura ocupa um espaço muito grande no Brasil, e se fizermos uma agricultura agroecológica, que seja regenerativa, como os sistemas agroflorestais, podemos impactar positivamente o regime hídrico, o clima, etc, de forma global”, relata Luiz.
Em contrapartida, a agricultura convencional, baseada na monocultura e na dependência de insumos químicos, impacta o planeta de forma negativa, contaminando as águas e o ar, emitindo gases de efeito estufa, promovendo erosão do solo, produzindo alimentos de baixa qualidade (transgênicos ou contaminados por agrotóxicos), envenenando muitos produtores rurais com agrotóxicos, entre outros.
Agrofloresta: uma agricultura mais sustentável
A forma como fazemos agricultura, principalmente no Brasil, que é um país agrícola, é uma responsabilidade muito grande.
“Você pode estar manejando só uma área, mas a soma de todas as áreas influencia muito todo o planeta”, finaliza Luiz.
Portanto, devemos fazer agricultura da forma mais sustentável possível, e o sistema agroflorestal entra como uma das melhores estratégias para restauração de ecossistemas.