Por MarSemFim
No passado recente os cientistas chegaram a sugerir que no máximo 20 rios seriam os responsáveis pela maior parte da poluição por plásticos dos oceanos. Seria muito bom se fosse verdade. Bastaria uma ação concentrada na maior parte deles para mitigar o problema. Mas a realidade parece bem diferente. Um estudo publicado na revista Science Advances mostra que 80% dos resíduos plásticos são despejados nos oceanos por mais de mil rios que serpenteiam por áreas urbanas superpopulosas mundo afora, e não apenas duas dezenas de grandes rios como se pensava.
O mapa mundi da Ocean Cleanup mostra quem é quem nos rios que mais levam plástico aos oceanos. Como se vê, temos grande responsabilidade.
Rios são o caminho principal do plástico nos oceanos
A National Geographic diz que antes o rio Yangtzé, que percorre 6,3 mil quilômetros pelo interior da China até desaguar no mar, era considerado o mais poluído por plásticos. Mas, segundo o novo estudo, ele foi ultrapassado pelo rio Pasig, com apenas 25 quilômetros de extensão, que corta a capital das Filipinas, Manila, com nada menos que 14 milhões de habitantes.
Algumas questões ficaram mais claras com este estudo. Uma delas é que a solução para o problema é muito mais complexa do que se imaginava. A outra reforça o que cientistas marinhos vêm dizendo há tempos. Ou seja, que a última solução para proteger os sistemas de água doce, e os oceanos, é conter os resíduos plásticos na terra, onde se originam.
A National Geographic ouviu Gary Bencheghib sobre o novo estudo. Ele é responsável pela campanha Sungai Watch, que procura limpar 45 rios em Bali, infestada por plásticos a ponto de perder a capacidade de atrair turistas.
“O estudo sobre os 10 rios, quando foi divulgado, me surpreendeu mais do que qualquer outra coisa. Não representava o que víamos nos menores riachos da Indonésia. Vivemos nos trópicos, numa região vulcânica onde existem rios literalmente a cada 500 metros e todos estão repletos de plásticos.”
Escoamento de detritos, um problema milenar
Desde que o ser humano deixou de ser caçador-coletor, 12 mil anos atrás, ele deu preferência para se estabelecer próximo a rios e ao mar. O motivo é óbvio, facilidade para conseguir água e comida mas, aos poucos, também escoar seus resíduos.
O problema, como mostra a pesquisa, é que mesmo com o progresso da civilização, e toda tecnologia hoje disponível, o processo de usar rios para escoar o lixo persiste nesta era da superpopulação mundial.
A National Geographic comenta que com o aumento exponencial dos resíduos de plástico na última década, a maioria dos estudos se concentrou nos plásticos dos oceanos. Os estudos em rios e outros corpos d’água ficaram em segundo plano.
Imagem: Pixabay
Agora corre-se atrás do prejuízo. A NG cita esforços para mapear alguns rios, como o que a National Geographic Society desenvolveu na primeira avaliação de grande escala de resíduos do rio Ganges, na Índia. E cita trabalhos semelhantes que estão sendo feitos no Mississippi depois que cem prefeitos de cidades ao longo do rio decidiram financiá-lo.
Não há rio, seja ele grande ou pequeno, que não passe pelo problema. Recente pesquisa da Universidade Federal do Pará (UFPA) mostra que peixes da Amazônia estão se alimentando de plástico.
A revista não mencionou os esforços de São Paulo que caminham na mesma direção conforme comentamos recentemente. Em janeiro de 2021 foi lançado o Plano Estratégico de Monitoramento e Avaliação do Lixo no Mar para o Estado de São Paulo – PEMALM.
A proposta do Estado é mapear os locais de entrada de lixo no mar. Especialmente os rios, esgotos, a atividade nos portos e na navegação. Segundo o site da Agência Brasil, o levantamento vai durar de seis meses a um ano, sempre em parceria com o IOUSP.
Plástico nos oceanos: saiba como foi feita a nova pesquisa
Segundo a NG a pesquisa se baseou em um novo modelo e foi conduzida por diversos cientistas que também participaram do estudo de 2017. O novo estudo abrangeu analises de resíduos plásticos em 1,6 mil rios.
O principal autor do estudo Lourens J.J. Meijer, disse à NG que “uma grande diferença de alguns anos atrás é que agora não consideramos que os rios são meros transportadores de plásticos.”
Da terra para os rios, e daí para o mar. Imagem: Ocean Cleanup
Entretanto, uma das considerações do primeiro estudo permanece e foi confirmada. Dos 50 primeiros rios da nova lista, 44 localizam-se na Ásia, segundo os autores, isto apenas reflete a densidade demográfica.
Laurent Lebreton, um dos co-autores do trabalho, disse à NG que “a Ásia e o sudeste da Ásia são os principais pontos, mas isso pode mudar.”
“A África representa um risco para as próximas décadas; a população está crescendo, há muitos jovens e o desenvolvimento econômico aumentará o consumismo.”
The Ocean Cleanup na frente de novo
The Ocean Cleanup é uma ONG fundada por um jovem idealista holandês, Boyan Slat, que tornou-se uma celebridade mundial depois de começar a sua batalha para limpar a Grande Mancha do Pacífico.
Pois saiba que o estudo agora comentado foi financiado por esta ONG. Slat também desenvolveu uma máquina coletora de lixo, espécie de balsa coletora que no momento trabalha para limpar o Inner Harbour, em Baltimore, Maryland.
Uma das balsas coletoras de lixo. Imagem: Ocean Cleanup.
A partir do sucesso desta empreitada, o holandês anunciou em 2019 planos para a produção de mil destas balsas com implementação em até cinco anos.
A balsa em ação
A pandemia diminuiu o ritmo do trabalho, diz a NG, mas muitos já estão em funcionamento em rios da Malásia, Indonésia, Vietnã e República Dominicana.
No site do Ocean Cleanup há um mapa mundi com os rios que poluem assinalados, veja aqui.
Segundo Slat o desafio é ampliar a produção para cumprir esta meta ambiciosa. Oxalá o jovem Slat continue inspirado.
Assista ao vídeo da Ocean Cleanup que explica o novo estudo: