Pensar em práticas que gerem menos lixo e menos impacto no meio ambiente é essencial nos dias de hoje. Devido a pandemia da Covid-19, que fez as pessoas passarem mais tempo em casa, o volume de lixo domiciliar aumentou. Segundo a Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), a geração de resíduo doméstico cresceu em mais de 10% e deve chegar a aproximadamente 25% ou mais. Uma ótima solução para esse problema é a compostagem.
Neste artigo, vamos explicar como funciona o processo de compostagem e qual a importância dessa técnica para o meio ambiente.
O que é compostagem?
Na natureza, o processo de transformação de restos orgânicos em solo ocorre em prazo indeterminado, dependendo das condições em que os restos se encontram.
Sendo assim, a compostagem foi criada com o objetivo de estabilizar matérias orgânicas de forma mais ágil e prática, seja em zonas urbanas, agrícolas ou industriais.
Esse processo consiste na decomposição microbiana de materiais orgânicos sob condições aeróbicas controladas. Desse modo, as próprias bactérias, fungos e actinomicetos, nativos do material, desde que fornecido o balanço adequado de nutrientes, umidade e oxigênio, são capazes de transformar os materiais biodegradáveis em fertilizante orgânico, que contém sais minerais e é rico em húmus (também chamado de “black gold”).
Portanto, a compostagem serve para reciclar os resíduos orgânicos e gerar um produto final com qualidade agronômica, que favorece a nutrição de plantas e melhora as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo.
A importância da compostagem para o meio ambiente
A compostagem é extremamente importante para o meio ambiente, uma vez que ajuda no desenvolvimento sustentável com relação ao tratamento e disposição de resíduos sólidos, minimiza os impactos ambientais e os rejeitos, e potencializa a reciclagem.
Imagem: Unsplash
Esse processo pode ser considerado uma tecnologia limpa, já que evita a disposição inadequada de resíduos orgânicos e o confinamento em lixões/aterros sanitários. Além disso, é uma técnica de decomposição microbiana de oxidação que libera para o meio ambiente apenas gases de baixo impacto ambiental (CO2), calor e vapor d’água. O produto final gerado pela compostagem resulta em um composto estabilizado com cheiro de terra e coloração escura, com qualidades agronômicas.
Outra vantagem é que esse processo pode ser realizado com baixo custo, em termos de energia e água utilizadas, tanto na produção das unidades de tratamento (composteiras), quanto no processo de transformação do material e uso do composto.
Além disso, quando a compostagem e uso do adubo são realizados nas proximidades da própria fonte de geração, como em residências, existe uma importante economia de recursos em relação à coleta, transporte e mão de obra envolvidos nessas etapas.
Por fim, essa técnica ainda pode proporcionar uma redução no consumo de fertilizantes químicos (NPK), que hoje são majoritariamente importados de outros países.
Como fazer compostagem
A compostagem tem uma regra fundamental: quanto mais diversificadas as matérias primas, mais garantido o sucesso do processo. A mistura entre os resíduos, incluindo materiais ricos em nitrogênio (geralmente suculentos e úmidos) e outros ricos em carbono (secos e com estrutura mais rígida), proporciona o alcance das condições adequadas durante o processo.
A partir de uma mistura adequada, a próxima etapa fundamental é o revolvimento do material. Isso deve ser realizado de uma a duas vezes por semana na fase mais intensa (início da decomposição), podendo ser mais espaçada no estágio final de maturação, quando o composto já se encontra quase pronto.
Os tipos de compostagem
Existem diversos modelos e escalas de compostagem, que se incluem em dois tipos de processos: naturais, nos quais se utiliza práticas de baixo custo, como leiras estáticas e revolvimento manual; e acelerados, nos quais são utilizados reatores mecanizados, máquinas de revolver ou outros equipamentos tecnológicos.
Além disso, também existem outras variações, que utilizam vermes, como as minhocas, que é um processo conhecido como vermicompostagem. Porém, esse processo se diferencia da compostagem tradicional, pois os agentes principais do processo são as oligoquetas, que necessitam de condições um tanto diferenciadas das exigidas pelos microrganismos do processo convencional.
Composteira: como funciona
Para processos de escala reduzida, como em domicílios, hotéis e restaurantes, é fortemente recomendado o uso de uma composteira, pois nela é possível realizar o processo com mais segurança em relação à atração de vetores ou acesso de crianças e animais domésticos.
Com diferentes formatos e mecanismos, ela funciona para acondicionar os materiais que se deseja compostar, evitando o espalhamento descontrolado, e facilita uma estrutura com camadas externas e internas mais homogêneas, uma vez que no interior da massa em degradação o processo de transformação é mais acentuado devido a elevação das temperaturas (causado pelo metabolismo exotérmico das próprias bactérias que realizam o processo).
Aos que contam com um jardim e desejam ter uma composteira, diferentes modelos podem ser empregados, valendo a criatividade e a disponibilidade de materiais – desde que não tenham sido utilizados previamente para armazenar materiais perigosos (tintas, óleos ou outros compostos químicos).
Pode-se citar os formatos cilíndricos, feitos por tonéis, caixa d’água, telas de arame ou chapas de metal; e os retangulares, utilizando caixas de madeira ou metal.
Entre os mecanismos principais deve conter tampa(s) para proteção e, por onde ocorre adição do resíduo e retirada do material, deve conter perfurações com aberturas ou furos redondos em diversos pontos das laterais, na parte inferior e superior, preferencialmente coberto com telas anti-mosquito. Além disso, é importante também que a composteira tenha espaço suficiente para a etapa de revolvimento do material, ou outro tipo de mecanismo que facilite a mistura das camadas externas e internas durante o revolvimento.
Cabe ressaltar que para quem deseja realizar a compostagem em casa, deve-se inicialmente escolher um local apropriado, preferencialmente arejado, com presença de sol e livre de encharcamento. E sempre utilizar luvas para manejar os resíduos e o composto produzido.
Fatores que influenciam na quantidade e qualidade dos compostos gerados
A qualidade da decomposição no material em compostagem está relacionada principalmente com: o balanço de nutrientes (relação carbono/nitrogênio de 25-30/1) disponíveis pela matéria prima adicionada; a comunidade microbiana existente, que quanto mais diversificada melhor; a granulometria (tamanho) do material adicionado, sendo recomendado partículas com tamanhos variados, idealmente com cerca 1,2 cm x 5 cm; teor de umidade entre 40-60%; e a aeração e porosidade do material, sendo indicado uma massa em degradação com cerca de 50% de espaços vazios.
Para o acompanhamento prático da compostagem, algumas observações ajudam a perceber se o processo está sendo bem conduzido, sendo: a temperatura, o calor gerado pelos microrganismos é o melhor sinal que o processo está dando certo, podendo ser observado na liberação de vapor de água ou com auxílios de termômetros; a ausência de mau cheiro, o cheiro de “ovo podre” (gás sulfídrico, causado pelo excesso de umidade) ou o cheiro de amônia (devido excesso de material rico em nitrogênio) são indesejáveis. O ideal é que o cheiro característico do material vá diminuindo com o tempo, até atingir um composto com odor agradável, parecido com o de terra molhada; a umidade, que deve estar presente apenas na superfície dos sólidos, sem excesso (sem escorrer); a coloração e a pegajosidade, ao fim do processo, o material deve apresentar a coloração cinza escura ou preta e uma consistência pastosa.
O que pode e o que não pode ser aproveitado na compostagem
Em pequena escala, recomenda-se utilizar principalmente restos de legumes, frutas e hortaliças associados com materiais palhosos, como folhas secas, serragem, cascas e palhas secas. Pode-se utilizar também, livremente, cascas de ovos, sobras de chás, galhos e flores de podas, penas e cabelos. Restringe-se o uso excessivo de grama e de frutas cítricas, devendo ser utilizado em pouca quantidade.
Devem ser completamente evitados resíduos de difícil degradação ou que contenham riscos químicos ou biológicos, como resíduos orgânicos tratados com produtos químicos, cinzas de cigarro, fezes de animais, papel higiênico. Além disso, apesar de biodegradáveis, deve-se evitar carne, peixes, gordura e queijo pelo risco de vetores, como moscas, baratas e roedores.
Compostagem: um processo seguro e de baixo custo
Instalar uma composteira, ou um sistema de compostagem, é vantajoso pois significa adotar um tratamento de tecnologia limpa, segura e de baixo custo.
Ao adotar a compostagem domiciliar, promove-se a redução dos custos públicos, como serviços de coleta, transporte e disposição final em aterros, e ainda favorece a segregação e qualidade de outros materiais recicláveis (papel, papelão, plástico e metais).
Esta sobra de recursos públicos advindos da economia com a gestão da fração orgânica do “lixo”, pode, por exemplo, ser utilizada como investimento em saúde, educação e segurança, ao invés de ser enterrada junto com o nosso lixo de cada dia.
Projetos voltados ao aproveitamento de resíduos orgânicos
O Núcleo Ensino, Pesquisa e Extensão em Resíduos e Sustentabilidade (NEPERS), da Universidade Federal de Pelotas, constituído por professores, alunos de graduação e pós-graduação, atua há mais de 10 anos na criação e execução de projetos voltados ao aproveitamento de resíduos orgânicos no âmbito familiar.
Um desses projetos (“Compostagem “in situ” da fração orgânica dos resíduos domiciliares”) foi desenvolvido em parceria com a prefeitura de um município (Capão do Leão/RS) do extremo sul do país, onde foram instalados sistemas de compostagem nos quintais de residenciais voluntárias.
Além de receber as composteiras, as famílias participantes contavam com visitas semanais de acompanhamento, feitas por uma equipe de estudantes do curso de Engenharia Sanitária e Ambiental, que forneceu capacitação e cartilhas orientativas, e realizou monitoramento do processo. A atividade proporcionou, principalmente, o domínio da técnica entre os moradores, que foram diretamente envolvidos, acompanhando não somente a geração de resíduos, mas também a segregação, o processo de produção e uso do composto. Assim, eles passaram por uma sensibilização no sentido de contribuir para a sustentabilidade da nossa sociedade, podendo vir a disseminá-la de uma forma natural e exponencial.
Outro projeto, ainda em desenvolvimento, em parceria com o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), intitulado “Compostagem de baixo custo de resíduos sólidos como tecnologia social para segurança alimentar e geração de renda”, foi elaborado visando a contribuição na autonomia econômica de famílias de um condomínio residencial, localizado em área de vulnerabilidade social no município de Pelotas/RS.
Nesse projeto, através de um processo participativo com as famílias, a fração orgânica compostável foi segregada e destinada a um sistema de compostagem de baixo custo. Tudo realizado nas mediações do condomínio, evitando custos com transportes, e resultando na produção de adubo orgânico, com a finalidade de serem aplicados em estufas de vegetação, para o cultivo de plantas ornamentais e alimentares.
Os alimentos serão destinados para o consumo próprio e o excedente da produção, juntamente com as plantas ornamentais, serão comercializados, gerando uma fonte de renda. Dessa forma, espera-se fomentar a segurança alimentar, melhorar as condições de saneamento, a prosperidade e o bem-estar da comunidade participante.